Os
cinemas de Brasília estão lotados nos últimos dias. Desde que estreou na
capital da República, o filme Bruna Surfistinha tem arrastado multidões para as
salas da cidade. Em sua maioria jovens, esse público tem ido consagrar a grande
musa da web da primeira década dos anos 2000, a menina de família classe média
de São Paulo que aos 17 anos torna-se prostituta e fica famosa na internet com
o seu blog que relata sua experiência com a mesma simplicidade dos diários
juvenis de outrora, porém com uma desenvoltura de provocar e excitar. O livro
“O doce veneno do escorpião”, no qual é baseado o filme e vendeu mais de 160
mil exemplares desde que foi lançado em 2005, ajudou a construir a fama. Agora
a película culmina uma história que mexeu e vem mexendo com a imaginação e os
desejos mais doces e sacanas de imberbes e marmanjos.
O
filme, de fato encanta e estremece as fantasias do espectador. Este, porém, não
é o seu mérito, se há que isto dizer. Para tanto o mercado e a própria internet
estão fartos de material talvez a proporcionar mais resultados para quem vá
procurar apenas por cenas de sexo. Para início, lá não as tem explicitas. Não é
muito menos uma produção no estilo das pornôs-chanchadas da década de 70. Bruna
Surfistinha é cinema de boa qualidade, com tudo que um bom filme tem: bom
roteiro, boa fotografia, excelente direção e bons atores. Não que Deborah
Secco, que interpreta a prostituta, seja lá essas coisas. A direção de Marcus
Baldini, no entanto, é tão eficiente que faz dela uma estrela de primeira grandeza.
Conta aqui seus atributos físicos e a semelhança com Raquel Pacheco, o nome
verdadeiro da protagonista. Mas sua interpretação – há que se reconhecer – é um
primor. De resto, as demais atuações seguem a mesma linha. De tirar o chapéu.
Agora
não se pode mesmo negar que outro grande atrativo da produção, especialmente
para o público em geral, é o escancarar de temas e o revolver de tabus ainda
presentes na sociedade em pleno século 21. Por outro lado, o voyeurismo é que
fala mais alto. Outro ponto: a
curiosidade em torno da vida escolhida pela personagem. Apesar de Bruna-Raquel
não ser uma novidade no mundo (aliás, desde que o mundo é mundo e a
prostituição é – dizem os entendidos - a profissão mais antiga). Sim, porque
garotas de classe média no universo prostituto não é nenhuma novidade. Ganha-se
dinheiro vendendo o corpo, isso é fato, embora os custos e efeitos colaterais
desse exercício profissional sejam em geral violentos. E não se consta que elas
recebam algum adicional de insalubridade e periculosidade. Mas as meninas
bem-nascidas estão lá, como a Surfistinha, e em muitos casos não é apenas por
causa de grana.
O
filme mostra esse ambiente de forma direta, sem meias palavras. Assim como o é
a protagonista. “Oi, eu sou a Bruna. Você pode fazer o que quiser comigo”.
Assim ela se apresenta aos clientes. E esse é um dos ingredientes que afloram a
excitação de machos e fêmeas (o cinema estava lotado delas). Bruna Surfistinha
não é uma prostitutazinha qualquer. É bonita de rosto e de corpo. Mas isso é
trivial. Sobram dessas por aí. Ela realmente gosta de sexo e se entregar aos
seus amantes com uma voracidade impressionante, embora com um ar de adolescente
ao se entregar ao namorado num fluxo alucinante de desejo da primeira transa. Cada
atendimento seu tem essa substância a mais. Em suma, Raquel-Bruna é uma
profissional que trabalha com muito prazer e agrega valor no que vende. Daí
talvez o segredo de seu meteórico sucesso.
Tudo,
no entanto, não são flores sempre e a decadência chega com o abuso das drogas e
a clássica escolha errada de amigos, no caso, amiga, em detrimento de quem
realmente o é e ama você. A volta por cima amarra a história e muitas lições
para ela e o espectador. Tudo isso contado de forma competente, emoldurada por
uma trilha sonora fantástica onde se sobressaem os melhores momentos de
Radiohead, para mim uma das melhores bandas inglesas da safra do final do
século passado. Aqui é no mínimo curioso, para quem assistiu e se emocionou com
“Fake Plastic Trees” embalando Carlinhos e seu amigo no famoso comercial de TV
na década de 90, ver agora a mesma canção pontuando os caminhos de Bruna
Surfistinha no filme. Mas convenhamos, Baldini acertou em cheio: a letra da
música está mais para Raquel do que para o menino no carrossel.
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