quarta-feira, 16 de março de 2011

Bruna Surfistinha é cinema de boa qualidade


Os cinemas de Brasília estão lotados nos últimos dias. Desde que estreou na capital da República, o filme Bruna Surfistinha tem arrastado multidões para as salas da cidade. Em sua maioria jovens, esse público tem ido consagrar a grande musa da web da primeira década dos anos 2000, a menina de família classe média de São Paulo que aos 17 anos torna-se prostituta e fica famosa na internet com o seu blog que relata sua experiência com a mesma simplicidade dos diários juvenis de outrora, porém com uma desenvoltura de provocar e excitar. O livro “O doce veneno do escorpião”, no qual é baseado o filme e vendeu mais de 160 mil exemplares desde que foi lançado em 2005, ajudou a construir a fama. Agora a película culmina uma história que mexeu e vem mexendo com a imaginação e os desejos mais doces e sacanas de imberbes e marmanjos.

O filme, de fato encanta e estremece as fantasias do espectador. Este, porém, não é o seu mérito, se há que isto dizer. Para tanto o mercado e a própria internet estão fartos de material talvez a proporcionar mais resultados para quem vá procurar apenas por cenas de sexo. Para início, lá não as tem explicitas. Não é muito menos uma produção no estilo das pornôs-chanchadas da década de 70. Bruna Surfistinha é cinema de boa qualidade, com tudo que um bom filme tem: bom roteiro, boa fotografia, excelente direção e bons atores. Não que Deborah Secco, que interpreta a prostituta, seja lá essas coisas. A direção de Marcus Baldini, no entanto, é tão eficiente que faz dela uma estrela de primeira grandeza. Conta aqui seus atributos físicos e a semelhança com Raquel Pacheco, o nome verdadeiro da protagonista. Mas sua interpretação – há que se reconhecer – é um primor. De resto, as demais atuações seguem a mesma linha. De tirar o chapéu.

Agora não se pode mesmo negar que outro grande atrativo da produção, especialmente para o público em geral, é o escancarar de temas e o revolver de tabus ainda presentes na sociedade em pleno século 21. Por outro lado, o voyeurismo é que fala mais alto. Outro ponto:  a curiosidade em torno da vida escolhida pela personagem. Apesar de Bruna-Raquel não ser uma novidade no mundo (aliás, desde que o mundo é mundo e a prostituição é – dizem os entendidos - a profissão mais antiga). Sim, porque garotas de classe média no universo prostituto não é nenhuma novidade. Ganha-se dinheiro vendendo o corpo, isso é fato, embora os custos e efeitos colaterais desse exercício profissional sejam em geral violentos. E não se consta que elas recebam algum adicional de insalubridade e periculosidade. Mas as meninas bem-nascidas estão lá, como a Surfistinha, e em muitos casos não é apenas por causa de grana.

O filme mostra esse ambiente de forma direta, sem meias palavras. Assim como o é a protagonista. “Oi, eu sou a Bruna. Você pode fazer o que quiser comigo”. Assim ela se apresenta aos clientes. E esse é um dos ingredientes que afloram a excitação de machos e fêmeas (o cinema estava lotado delas). Bruna Surfistinha não é uma prostitutazinha qualquer. É bonita de rosto e de corpo. Mas isso é trivial. Sobram dessas por aí. Ela realmente gosta de sexo e se entregar aos seus amantes com uma voracidade impressionante, embora com um ar de adolescente ao se entregar ao namorado num fluxo alucinante de desejo da primeira transa. Cada atendimento seu tem essa substância a mais. Em suma, Raquel-Bruna é uma profissional que trabalha com muito prazer e agrega valor no que vende. Daí talvez o segredo de seu meteórico sucesso.

Tudo, no entanto, não são flores sempre e a decadência chega com o abuso das drogas e a clássica escolha errada de amigos, no caso, amiga, em detrimento de quem realmente o é e ama você. A volta por cima amarra a história e muitas lições para ela e o espectador. Tudo isso contado de forma competente, emoldurada por uma trilha sonora fantástica onde se sobressaem os melhores momentos de Radiohead, para mim uma das melhores bandas inglesas da safra do final do século passado. Aqui é no mínimo curioso, para quem assistiu e se emocionou com “Fake Plastic Trees” embalando Carlinhos e seu amigo no famoso comercial de TV na década de 90, ver agora a mesma canção pontuando os caminhos de Bruna Surfistinha no filme. Mas convenhamos, Baldini acertou em cheio: a letra da música está mais para Raquel do que para o menino no carrossel.

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