terça-feira, 24 de julho de 2012

Patrícia não quer mais dar de graça

Ela tem tudo de uma linda mulher. Pode imaginar as medidas, formas, cabelos, cheiro, boca e olhos. Um misto de sensualidade e animalesco. Se é que pode. Dentro disso tudo reside, no entanto, uma alma ingênua, simplista e até simplória. Patrícia, paradoxalmente, tem muito de mulher fatal e muito de brejeira, qual as meninas que conhecia faz muito tempo na velha Jaraguá, no interiorzão de Goiás. Lá estava Leila e seu beijar intenso, seu enroscar profundo. Mas quando a calma tomava conta do seu corpo, a menina furacão se amanhecia brejeira e não raro com um olhar desconfiado e triste.

Tenho comigo que as mulheres em geral são assim, paradoxais por natureza e a fatal mistura de pura e impura. E, acredite, não apenas na aparência. É assim Patrícia. A moça tem muito dos dois padrões afetivo-sexuais da mulher, a santa e a prostituta. Assim como há para o homem o trânsito mais comum entre o papai e o cafajeste; por hora, no entanto, estou falando de uma mulher.

Mesmo assim, seu ar de mocinha aborrecida não combinou com o aviso: “A partir de agora não vou mais dar de graça.” Teria assustado se não conhecesse Patrícia e não fosse familiarizado com seus grilos, apuros e rebeldias. No entanto demorei alguns segundos para recompor e tentar decifrar o decreto. Foi que ela me revelou da última vez que ficou: tudo lindo, mágico e suave, que a paixão poderia ter explodido dali. Patrícia gosta de se entregar como uma broca de plataforma petrolífera: vai nas profundezas, muito além da camada do pré-sal. A contrapartida que sempre esperou foi de um olá no dia seguinte, um comentário sobre o desempenho mútuo e a brecha para uma próxima.

Qual nada! Fazia tempo que Patrícia não angariava desse prêmio. Revolta que só. Muito decepcionante e humilhante para uma mulher ter se sentido apenas um objeto. Muito embora nesses tempos modernos elas saibam como ninguém usar o homem como tal. Se antes como mero provedor (papai), agora ainda como um brinquedo sexual e do prazer. Ou seja, as mulheres estão sabendo domar e domesticar os cafajestes.

Não é sempre assim com todas e nem sempre com as que conseguem dominar a arte dessa doma. De vez em quando elas têm recaídas. E fortes. É o conflito entre a santa e a puta. Por mais puta que elas sejam, não querem parecer ser e será preciso revelar que algo mais estava embutido naquele momento de prazer puro e simples. Algumas ousam dizer que só querem sexo casual. Mas não será bem assim no dia seguinte, quando a outra é suplantada momentaneamente pela santa.

Referi-me agora a “outra” lembrando-me da letra da música “Cálice”, de Chico Buarque e Gilberto Gil. Por conta da censura e da inconveniência de mencionar “puta”, eles compuseram assim: “Do que me vale ser filho da santa; melhor seria ser filho da outra”. Aqui era para ser rima de “labuta” e “escuta” antes e “bruta” depois. Portanto, não seria perversão imaginar quando alguém se referir à "outra" ou ao "outro".

Voltemos, pois, à Patrícia. A moça, em verdade, estava indignada por ter sido transformada na “outra”, simplesmente, sem premiação alguma. Não que ela desse bola para ser santinha. Então, se não havia a compensação de um contato no dia seguinte, seja por telefone, e-mail, sms, msn, gtalk ou face, não valia para ela mais a pena continuar de graça.

“Agora vou cobrar”, emendou de forma impávida e concomitantemente acuada e tímida. Mais paradoxal impossível. Patrícia é assim, no som e no tom da voz, nas caras e bocas, nos gestos e trejeitos e no gingado. Muitas comunicações profusas num corpo só.

Não sei se Patrícia cumpriu a promessa e, em que pese a curiosidade tanta, não procurei saber. Só fiquei imaginando que aqui em Brasília, uma cidade onde as mulheres liberadas financeira e afetivamente instituíram a figura do PA (pau amigo) ou PF (Personal Fucker) e lidam muito bem com a indiferença de seus brinquedinhos eventuais, ainda existam moças como Patrícia. Pobre menina...

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