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Confira o artigo "A estranha história de uma errata", escrito por Luiz Weis para o Observatório da Imprensa. O jornalista expõe estranhas condutas da Folha de S.Paulo ao tratar de um artigo sobre Henry Sobel.
No dia 1º de abril, a Folha publicou um artigo do historiador Jaime Pinsky que começava assim:
"Conheci o rabino Sobel no enterro de Vladimir Herzog, o Vlado."
Duas edições depois, o jornal saiu com a seguinte errata:
A primeira frase do artigo "O rabino Sobel e o Brasil" estava errada. Em vez de "Conheci o rabino Sobel no enterro de Vladimir Herzog, o Vlado", o correto é "na época do enterro". O rabino Henry I. Sobel não esteve presente no enterro.
Ao que se saiba, nem a Folha, nem outros jornais brasileiros têm o cuidado de checar os fatos em artigos de colaboradores das suas páginas de opinião.
O New York Times, por exemplo, checa. Se um articulista convidado escrever na sua op-ed page [a página oposta à dos editoriais] "Colombo descobriu a América em 1592 e isso foi uma tragédia", o checador substituirá a data errada por 1492, deixando intacto o resto, por ser uma questão de ponto de vista.
Se, por inadvertência do checador, o 1592 passar batido, o jornal assumirá a responsabilidade pela falha quando publicar a correção.
Por isso mesmo o "Erramos" da Folha soou estranho. Emendou um equívoco de um articulista externo, como emenda, quando o faz, equívocos em textos de seus repórteres, redatores e colunistas.
Só que a errata tem uma história que não chegou aos leitores do jornal.
Começa com uma carta que o jornalista Rubens Glasberg enviou ao "Painel do Leitor". Dizia:
"O historiador Jaime Pinsky deve estar confundido quando diz em seu artigo de domingo nesta página que conheceu o rabino Sobel no enterro de Vladimir Herzog. Ele deve ter visto Sobel pela primeira vez na Catedral da Sé, ao lado de D. Paulo Evaristo Arns, que foi quem liderou a organização do culto ecumênico reunindo pela primeira vez uma multidão contra a barbárie da tortura durante o regime militar no Brasil.
No enterro de Herzog e anteriormente no velório no necrotério do Hospital Albert Einstein nenhum rabino se fez presente. Cerca de duas centenas de pessoas acompanharam o corpo do jornalista ao Cemitério Israelita do Butantã, onde a cerimônia religiosa do enterro contou apenas com a presença de um cantor litúrgico.
No caso Herzog, Sobel só projetou seu nome no culto da Sé. Evitou depois prestar qualquer depoimento no processo movido pela família de Vlado contra a União, onde poderia esclarecer de vez a decisão de enterrar ou não o corpo no local do cemitério reservado aos suicidas. Estive no enterro e acompanhei o início do processo como editor de "Política" da Folha.
Se Pinsky, como diz, conheceu Sobel num enterro, não foi no de Vladimir Herzog."
Eis uma carta que a boa técnica jornalística mandaria publicar na íntegra, porque, no seu penúltimo parágrafo, vai muito além da ausência do rabino no enterro de Herzog, oferecendo uma outra visão da conduta do religioso ao longo do caso.
Admita-se, para argumentar, que a Folha publicasse uma versão reduzida da carta, por razões de espaço. Mas o jornal, em vez de publicá-la, preferiu a via torta de arquivá-la e de assumir um erro que não era seu.
A história continua. Desconfortável, Glasberg tornou a escrever - dessa vez para o ombudsman da Folha:
"Enviei na segunda-feira (02/04/07) uma carta ao "Painel do Leitor" sobre o caso Sobel.
A carta não foi publicada e em seu lugar no dia 03/04/07 saiu uma notinha na seção "Erramos".
A minha carta não se refere apenas ao equívoco de um historiador. Ela tenta colocar as coisas em seu verdadeiro contexto no momento em que está em andamento uma verdadeira campanha "salvem o rabino Sobel".
Não considero ética a solução encontrada pela Folha para livrar a cara de mais uma figura (um historiador) que tentou pegar carona no caso Herzog, ainda não relatado em todos os seus pormenores.
Sobre Sobel, nesse episódio, pode-se hoje seguramente dizer o seguinte:
1) Nem ele e nenhum outro rabino estiveram no velório e no enterro. D. Paulo Evaristo foi ao velório e manifestou surpresa pela ausência de um rabino.
2) Houve pressões para que o cardeal não organizasse depois o culto ecumênico na Sé. O rabino Sobel, segundo testemunhas, estava entre os que não queriam a cerimônia pública.
3) O culto ecumênico saiu pelo empenho e determinação do cardeal.
4) O rabino Sobel acabou comparecendo ao ato (o que, sem dúvida, foi prova de coragem) e lá fez seu nome no Brasil e ganhou notoriedade internacional.
5) Apesar de procurado depois pelos advogados da família Herzog, ele não prestou depoimento no processo movido contra a União.
Quero ressaltar que o comportamento do rabino e dos demais líderes da comunidade judaica na época não diferiram em nada do comportamento do resto da sociedade brasileira. Todos tinham medo, muito medo. Médicos não-judeus que viram o corpo de Vlado também calaram. Vale lembrar ainda que muitos brasileiros originários da comunidade judaica foram assassinados na luta contra a ditadura ou perderam preciosos anos de sua juventude na prisão e no exílio.
Acho importante, como jornalista que ainda sou, tentar ter uma visão objetiva dos fatos e colocá-los em sua real dimensão.
Anexo o texto da minha carta, ignorada pela Folha, e a nota do "Erramos" sobre o artigo publicado em 1º de abril, curiosamente no Dia da Mentira."
Nenhuma das cartas foi respondida.
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